Enquanto as universidades estaduais de São Paulo têm recursos vinculados, o que garante autonomia de gestão financeira, as mineiras não contam com qualquer garantia de destinação de verbas. O orçamento das instituições universitárias em Minas Gerais ficam, então, à mercê dos governos que se sucedem.
Isso permite, por exemplo, anúncios como o feito pelo governador Romeu Zema (Novo) em junho: ele cortou mais de 50% dos recursos aprovados pela lei orçamentária para 2022 para a Universidade Estadual de Minas Gerais (Uemg) e Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
A questão foi ressaltada pelos convidados de audiência pública na Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Roberto Kanitz, presidente da Associação dos Docentes da Uemg, salientou que o corte anunciado por Zema recai sobre um orçamento já precário, que não garante o custeio básico das instituições. “As universidades estaduais de Minas Gerais não têm sede própria, os docentes não tem gabinetes, os laboratórios são precários”, ressaltou.
Para o convidado, o atual governo é “inimigo” das universidades públicas e têm proferido vários ataques a elas. Como exemplo, ele citou proposta de avaliação global dos docentes que utiliza parâmetros de empresas privadas, tratando as relações de professores e alunos como se fossem relações comerciais. A avaliação poderá ter como resultado, segundo ele, ainda mais redução de recursos para todos.
Modelo ideal
Como modelo de financiamento de universidades públicas relativamente bem-sucedido, foi apresentada durante a reunião a situação das instituições paulistas. Como foi apresentado pela presidenta da Associação de Docentes da Universidade Estadual de São Paulo (USP), professora Michele Ramos, desde a década de 1990 essas instituições têm verba vinculada ao ICMS.
Atualmente, 9,75% da contrapartida estadual desse imposto é destinada à USP, à Unicamp e à Unesp, as três universidades estaduais paulistas. “A luta para autonomia nas universidades paulistas remonta à década de 1970 e as conquistas mais importantes vieram no fim da década de 1980 com uma grande greve realizada no período”, explicou.
Ainda assim, segundo a convidada, essas instituições também têm sido alvo de ataques que têm resultado em subfinanciamento. Uma das formas que tem sido utilizadas para se retirar recursos das universidades paulistas é a de descontar indevidamente algumas rubricas do valor bruto sobre o qual a porcentagem vinculada deveria recair.
Segundo Michele Ramos, o ICMS arrecadado com juros e mora da dívida pública, por exemplo, não tem entrado no cálculo. Descontos como esse retiraram das instituições de ensino cerca de R$ 77 bilhões em 2022, de acordo com a convidada.
A professora da USP também demonstrou preocupação com as iniciativas no sentido de facilitar a entrada de capital privado nas universidades públicas, iniciando assim um processo de privatização.
O deputado Professor Cleiton (PV) lamentou que, mesmo com um modelo de financiamento como o de São Paulo, que já tem mais de 33 anos de história, Minas Gerais ainda não tenha trilhado caminhos em direção à autonomia universitária. Segundo ele, as instituições de ensino universitárias mineiras estão entre as que têm o menor investimento por aluno do País.
Outros problemas
Como resultado do subfinanciamento, os convidados citaram dificuldades enfrentadas no dia a dia por professores e alunos. Uma das questões apontadas foi a ausência de recursos para garantir condições mínimas para funcionamento dos campi estendidos, ou seja, dos cursos oferecidos em outros municípios que não aquele que é sede da universidade.
O professor da Unimontes Danilo Barcelos, por exemplo, explicou que ele tem a carga horária dividida entre atividades em Montes Claros e em Januária, mas não recebe qualquer ajuda de custo para o deslocamento entre as cidades. Também não há, segundo ele, qualquer auxílio para o deslocamento dos estudantes, que muitas vezes precisam cursar disciplinas em outros municípios.
Outra questão salientada foi a precarização das condições de trabalho dos professores. Segundo a professora Lais Godoi Lopes, da Uemg, eles seriam constrangidos a aumentarem o número de horas dedicadas às aulas, retirando, assim, a carga horária de atividades de pesquisa e extensão.
Além disso, os docentes não seriam pagos conforme sua titulação, com doutores sendo remunerados como mestres.